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Daniela Bernardes

O que Brumadinho tem a ver com você?


Foto: diariodaamazonia.com.br Tragédia, esse é o nome dado ao ocorrido em Brumadinho. Algo que não se espera, que neste caso poderia ter sido previsto e não foi, poderia ter sido evitado e não foi e essa é a indignação sentida pelos que ficaram e perderam seus entes queridos.

A questão que intitula o texto tem como objetivo chamar a atenção para algo que eu, você e todas as pessoas vivas passarão um dia desses aí, algo chamado luto. Sim, este que ronda nossa vida desde que nascemos, que permanece à espreita apenas aguardando a hora de aparecer em nossos corações quando alguém amado e querido se vai.

No caso de Brumadinho, muitos já se veem nessa condição, mas com um detalhe muito mais difícil de aceitar: como velar alguém que simplesmente sumiu? Como se despedir de alguém que desapareceu na lama? Como dar sentido a algo que não tem justificativa ou explicação? Como?

Estas e outras perguntas vêm e vão na mente de cada um dos que perderam seus entes queridos, vem para tentar fazer com que o sentido apareça de alguma forma, para tentar fazer com que o ente querido apareça de maneira mágica, como se nada disso tivesse acontecido, como se a vida pudesse retornar e ser como era antes, mas não, ela não pode. O luto veio, virá e permanecerá por algum tempo nos corações dos que ficaram.

O que Brumadinho tem a ver comigo e com você? Tem a ver que somos humanos, passíveis de dores e pesares, dos mais amenos aos mais penosos e que cedo ou tarde perderemos, mas para a maioria de nós podendo velar, para grande parte, podendo se despedir e para a minoria, sem chances de fazê-lo (como eles), mas todos, sem exceção, sentirão a dor da perda.

E você sabe por que ela vem? Sokolowski (2004) a descreve muito bem, ele diz assim: “desde que vivemos na condição paradoxal de ter o mundo e ainda ser parte dele, sabemos que quando falecermos o mundo ainda continuará, desde que somos apenas parte do mundo, mas em outro sentido o mundo que é aí para nós, por todas as coisas que sabemos, se extinguirá quando não fizermos mais parte dele. Tal extinção é parte da perda que sofremos quando falece um amigo próximo; não é só que ele não está mais aí, mas o modo que o mundo era para ele também foi perdido para nós. O mundo perdeu um modo de ser dado, um modo que foi construído ao longo de toda uma vida.”

Veja você, um modo de ser único se foi, não é a toa que dói tanto, não é a toa que enlutamos e somatizamos muitas vezes. O luto faz parte da vida, como a poda faz parte da árvore que deseja crescer e florescer novamente, por vezes a poda é brusca e demoramos para nos recompor.

Esse foi o caso de Brumadinho, a poda foi devastadora e deve demorar a dar frutos novamente, mas não quer dizer que não crescerão novamente, que seus galhos não mudarão de rota, que suas folhas terão novas configurações, que não sairão mais fortes disso.

Por tudo isso, deixamos aqui nossa homenagem aos que sobreviveram e aos que se foram aos que se dedicaram a salvar, a enfrentar e a ensinar com as perdas, como a luz de uma vela que se acende em meio ao caos:

“Mais uma vela que se apaga,

Um luto que não sara.

Como sarar, se não se tem paz?

Como renascer onde a lama jaz?

Eu, você e todos a observar,

Um luto que não cessa,

Uma lágrima sem pressa,

Sem ter a quem culpar.

Como esse luto vai passar?

Sem ter um corpo a velar?

Como poderei sarar?

Só peço uma única coisa.

Agora que a lama me levou.

Peço que haja justiça,

E esperança a quem ficou!

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